Fruto de fortes emoções
Que fervilham e pulsam
A cada batida do coração
Nasce cristalina e quente
Brota num canto
Do espelho da alma
Que reflecte a imagem
De sentimentos
Que não se controlam nem explicam
Suavemente desliza
Sem pressa…
Num rosto marcado pelo tempo
Abrindo novos caminhos
Entre os seus sulcos
Um pedaço de mar salgado
Onde se guardam
Sorrisos, alegrias e tristezas
Onde se escondem
Fúrias e revoltas
Onde se dão abraços
E se trocam beijos de despedida
E de reencontro
Gritamos e choramos
Rimos e soluçamos
No seio de uma lágrima…
Máscaras de ferro sorriem para mim…
Ou apenas os olhos que consigo vislumbrar
Na penumbra da sombra que reflectem
Voltam-se para mim quando passo
Fitam-me…
Olham-me como se procurassem entender-me
Escondem rostos que não se sabe de quem são
E espreitam em busca de respostas
Tentando desvendar emoções que ignoram
Desistiram de ser quem eram
Abandonaram o labirinto da vida
E perguntam-se como caminho sem máscara
Como exponho o meu rosto ao mundo
Sem segredos, sem medo de julgamentos
Despidas de verdade
Vivem na mentira
De exibirem o que não são
Permanecem no escuro
Privando de luz as suas almas
Que se apagam lentamente
E que se alimentam apenas
De observar quem se ergue das cinzas
E vivem assim…
De rostos escondidos…
Cheguei ao mundo de mãos vazias
Vazias de sonhos
Despidas de emoções
Prontas para se encherem de vida
Para receberem histórias
Sentirem momentos
Estendidas e nuas
Esperam sem pressa
Dão e recebem
Não se fecham
Porque sabem
Que nada lhes pertence
Servem apenas de recipiente
Para se encherem e esvaziarem
Trago as minhas mãos vazias…
Nelas se escoa o tempo
Nelas se formam rugas
Testemunhas de que esse tempo corre
Com as minhas mãos vazias
Vivi, sonhei, viajei
Ri e chorei
Continuam aqui
Esperando sempre o que vier
E à espera fico eu também
De mãos vazias…
Nos teus olhos ainda vejo sonhos
Reflexos de luz de todas as cores
Olho para ti
E perco-me no encanto do teu sorriso
Carregas contigo um brilho próprio
Como o de uma estrela
Que pulsa no universo
Os teus medos são a tua teia
Que te prende
E não te deixa viajar
E as teias são tão fáceis de romper…
Mas a tua é sólida
Vives dentro dela
Como um peixe num aquário
Que nunca sentiu a bravura das ondas
E das correntes que arrastam para outros lugares
Pode até ser nesse aquário
Que te sentes segura e protegida
Mas não é nele
Que podes enfrentar outros desafios
Que te podem dar oportunidade
De sorrir com a alma
De dentro para fora
Respira fundo e segue
O caminho nem sempre é a direito
Por vezes existem buracos bem fundos
Caímos neles
Mas levantamo-nos
Sacudimos o pó
Saramos as feridas e continuamos
Vale sempre a pena seguir...
Tu foste o meu caminho com flores!
Dele guardo o cheiro
As emoções de cada passo
Pensa no caminho das flores
E sorri…
E continua a caminhar…
Sem olhar para trás…
Será que vale a pena
Continuar a remar para ali
Quando a corrente me arrasta para o outro lado?
Vale a pena correr contra o vento?
Vale a pena ir para lá
Quando todos vêm para cá?
Já não sei nada…
Às vezes apetece-me deixar ir
Mas dizem que não devo…
Devo lutar
Devo ser forte
Alguém sabe o que é ser forte?
Então que me diga por favor
Porque eu não sei
É fingir que nada se passou?
É isso?
É continuar a sorrir?
Mesmo quando a vontade é de chorar?
Se é isso…
Consigo às vezes
Só às vezes…
Depois, quando fico sozinha
E deixo cair a máscara
Está lá tudo…
Estão lá as lágrimas que não secam
Está a dor que toda a gente diz
Que o tempo apaga
O tempo não apaga nada…
Garanto que não…
E não há nada que consiga disfarçar
Uma alma que grita em silêncio
Cujo som é abafado pelas rotinas
Que não esperam…
Que obrigam a erguer a cabeça…
Tudo forçado…
Porque o tempo não espera…
Quando se fala em anjos
Viaja-se para outra dimensão
Bem distante desta onde nos encontramos
Algo como o Céu, o Paraíso…
Isto para quem acredita em anjos celestiais…
Eu acredito mais nos anjos de carne e osso
Não têm que ser loiros nem ter olhos azuis
Nem precisam de saber tocar harpa
E tenho a bênção de conhecer alguns
Pegam-me ao colo quando caio
Deixam pegadas no meu caminho
Dão-me a mão quando está fria
Ouvem-me quando preciso de falar,
Seja de dia ou de noite…
Abraçam-me e secam-me as lágrimas
Sabem como me sinto sem ter que falar
Riem-se quando me vêem feliz
E eu bebo dos seus sorrisos
Partilho com eles sonhos e pesadelos
E no sopro das suas vozes
Suave e doce nos meus ouvidos
Deixo-me voar nas suas asas…
No silêncio da noite
Quando apenas o luar me ilumina
E as estrelas me espreitam
Páro para pensar nas palavras que disse
Ou que deixei de dizer...
E fico feliz quando me apercebo
Que tenho dito
Aos que me rodeiam
Aos que fazem parte da minha vida
O que sinto
O que vai dentro de mim
Um 'obrigada'
É um reconhecimento
A alguém que de certa forma
Me proporcionou algo de bom
Quando digo 'amo-te'
Aos meus amigos
Eles ficam a saber o carinho
Que nutro por eles
Quando digo 'tenho saudades'
Expresso a falta que alguém me faz
A importância que a sua presença tem para mim
Quando digo 'estou triste'
Despejo a minha alma
E procuro um conforto
Quando digo 'hoje estou feliz'
Também faço alguém feliz
Porque me quer bem
E pergunto
Quantos o fazem?
Porque é que as pessoas têm tanto medo de dizer certas palavras?
Porque as querem guardar para momentos especiais?
Porque não têm coragem de as dizer?
Para todos os momentos existem palavras certas...
É bom olhar para trás e saber que as disse
E que as digo quando as sinto
As palavras não se gastam
Os sentimentos também não
Dizer palavras
Definir emoções
Liberta-nos
Se não as disser hoje
Quando as sinto
Terei oportunidade de dizê-las mais tarde?
Pensamos sempre que sim...
Mas nem sempre isso é verdade
As palavras não são apenas letras ordenadas
Quando ditas e sentidas
Com verdade
Com alma
São capazes de nos mudar
Poque as dizemos
E de mudar os outros
Porque as escutam e sentem...
'Então não foi tão bom Soninha?
Eu acho que foi muito bom!'
Era sempre assim...
Quando eu espirrava
Por ter andado descalça
Depois de ouvir infinitas vezes
'Ao menos calça umas meias'
As rugas não correspondiam
Ao espírito jovem
De uma avó
Que andava na universidade
Tornou-se mais forte
Quando a vida a desiludiu
Não se entregou
Não se deu como vencida
Nunca!
Sempre ergueu a cabeça
E caminhou...
Segura
Firme
Com quase trinta anos
Ainda ia para o colo dela
'Avó, conta-me quando eu era pequenina
E cheguei de Angola'
E pela milésima vez
Enquanto me fazia festas no cabelo
Repetia as mesmas histórias
Que eu já sabia de cor
'Vinhas muito magrinha
Muito doentinha
Com os teus olhinhos azuis
Muito apagadinhos
A avó tinha feito mioleira com ovos
Para ti e para o teu irmão
E tu comeste o teu e o dele
Assim que mudaste de ares
Ficaste logo outra menina'
E contava tudo
Como se fosse a primeira vez
E os meus olhos brilhavam
Por ver reflectidos nos dela
As imagens que relatava
Com saudade...
'Vive sempre o momento presente
Porque logo é passado'
Dizia-me com o ar sábio
De quem já cá estava há muito tempo
Há 13 anos que foste embora avó
Mas todos os dias me lembro de ti
E serás sempre um grande exemplo
De Mulher!
Amo-te avó Vina...
Um sonho perdeu-se
E desvaneceu-se…
Afogou-se nas lágrimas
De quem o teceu
Ficou para sempre
Apenas como um sonho
Ficou para sempre
Abraçado na fraqueza
De quem já não tem
Forças para o abraçar
Um sonho deixou de brilhar
Perdeu o pulsar…
Desfez-se nas margens
Dum mar tempestuoso
Que o arrastou para longe
Para no seu fundo o enterrar
Dele ficou tão somente
A memória
Ficaram notas de música soltas
Que nenhum piano já consegue tocar
Um sonho perdeu-se
E desvaneceu-se
Ficaram mudas as ondas
Que agora gritam em silêncio
Guardando um segredo
Para sempre por desvendar
Voo como um pássaro livre
Rasgo o azul do céu por onde passo
Não tenho medo de voar
Não tenho medo de cair
Só quero caminho aberto
Para abrir as minhas asas
Para me libertar do peso
De ter os pés no chão
Quero voar
Num azul sem grades
Furar nuvens
E cruzar tempestades
Não quero voar em bando
Quero voar sozinha
Não quero seguir caminhos
Previamente definidos
Quero voar
Para onde o vento me levar
Deixar pintar as minhas penas
Com as cores do arco-íris
Quero sentir a brisa do mar
A salgar as plumas com que me visto
E à noite, já cansada
Regressar ao meu ninho…