Pensava eu que te tinha sonhado
Num sonho de encantar
Fruto apenas da minha imaginação
Pensava eu que te tinha amado
Numa música de embalar
Num suspiro suspirado… e suado…
E acreditei que sim…
Que te roubei o chão aos pés
Que te rasguei o medo de voar
Pensava eu…
Pensava eu que eram de seda
Os braços que me atracavam ao cais
Que eram de aço
As notas soltas que o teu coração ecoava
E acreditei que sim
Que a tua pele quente de canela
Saboreava com prazer o meu tom de baunilha
Numa mistura exótica de paladares
Que se fundiam e confundiam...
Que os meus olhos de esmeralda
Se deleitavam com os teus de azeitona
Pensava eu…
E acreditei que sim
Que os teus dedos longos
Se perdiam nos fios dourados dos meus cabelos
Que respirávamos do mesmo ar
Que beijávamos os mesmos lábios
Que segredavam palavras por decifrar
Pensava eu…
E quando me preparava para acordar
Para abrir os olhos e não te ver
Abraçaste-me mais uma vez…
E senti-te de verdade
Pensava eu que te tinha sonhado…
Mas tenho ainda em mim
O cheiro com que me enfeitaste
A marca do teu beijo
No meu pescoço perpetuada…
Às vezes fico assim...
Quieta...
Num silêncio profundo...
Onde o tempo pára
E a noite fica longa...
E fico assim...
Sinto apenas o peso das pálpebras
Que se apertam agarrando a escuridão
Como se de um tesouro se tratasse
Sim, um tesouro...
Porque nela consigo vislumbrar-te...
Trincas o lábio de baixo
E sabes que me desconcertas...
Dois olhos negros
Despem-me num segundo
E fico sem segredos...
Sim, os teus...
Um sorriso provocador
Perturba-me sem piedade...
Sim, desenhado nos teus lábios carnudos
Onde me perco em beijos de algodão doce
Coças a cabeça
Sempre que não sabes
O que dizer a seguir
E eu...?
E eu fico assim...
A beber a cada momento...
E contenho um sopro de ar
Que não se consegue escapar
Quando acredito que ouvi
Agora mesmo... agora mesmo...
'Anda...'
E banho-me num arrepio
Que me desperta cada poro...
Um a um...
E fico assim...
Já estavas à minha porta
Quando cheguei...
Os meus olhos bateram nos teus
E a luz que irradiavam
Tirou-me da sombra
Onde me escondia
Cada vez que não sabia de ti...
Os teus lábios tocaram os meus
Num beijo suave de veludo
Onde tentei dizer-te tanta coisa...
Que tinha medo...
Mas que ainda acreditava,
Que sentia a tua falta...
Que precisava de ti...
Mas nem uma palavra
Consegui articular...
Tive esperança
Que no sabor do meu beijo,
Misto entre o doce da paixão
E o salgado da minha insegurança,
A mensagem fosse passada...
Tu fingias não entender
Sabias tudo o que me inquietava
Mas sorrias como quem diz:
'Anda... O que receias?... Afinal estou aqui...'
Sim, tu estavas ali...
Radiografavas-me entre cada piscar de olhos
Querias ler a minha alma
Mas o emaranhado de emoções
Fazia-te tropeçar
A ti e a mim...
A tua voz quebrou o silêncio
Como uma pedra atirada ao mar
Que desconhece a sua profundidade
E o impacto que vai provocar
Trouxeste à luz
Tudo o que guardavas só para ti
Eu fiz o mesmo...
Trocámos as chaves das caixas
Onde guardamos os medos
E os desejos...
Afinal é tudo tão simples...
Amar-te é simples...
Amar-me é simples...
Um abraço tem o poder
De derrubar muros que pareciam gigantes...
E uma paz imensa
Desceu sobre nós
E amámo-nos numa entrega única
Feita de confiança
Feita de certezas
Apagaste os meus soluços
Quando me aconchegaste
Num afago quente
Quando as tuas mãos
Grandes e apaziguadoras
Me devolveram o conforto
Que julgava perdido... sem retorno...
Sim, tu estavas ali...
No escuro da noite
Posso chorar sem ninguém ver
Posso ficar enroscada
No quente da minha cama
Envolta em memórias
Que já não sei se vivi...
Ou se apenas sonhei...
Nunca vais saber
Ninguém o sabe
Só eu...
Eu e a fronha da minha almofada
Que serve de esponja
À água que os meus olhos vertem
E onde afogo as saudades
De curtos instantes
Que me soaram a eterno
E assim adormeço
Embalada pelos soluços
E pelo desassossego do meu coração
Que salta e estremece
Cada vez que oiço o silêncio
Onde me deixaste mergulhada
Os meus braços envolvem-me
E fazem o papel dos teus
Protegem-me e fingem não ser meus
Mas aqueles com que um dia
Me fizeste acreditar
Que me segurariam se perdesse as forças
E caísse...
Mas afinal são os meus
Que se erguem
E não me deixam tombar
São os meus
E não os teus...
Deles apenas me ficou
A sensação breve
Dum abraço forte
De ti
Um espaço vazio
No escuro da noite...
Lembras-te daquela noite?
A lua estava cheia
Num céu frio de Janeiro
Em que as estrelas cintilavam
Como pirilampos numa noite quente de Verão
Lembro-me dos teus olhos...
Colados nos meus
Como ímanes que nos prendiam o olhar
Inundado de desejo
Do rio vinha o som calmo das águas
Que afagavam as suas margens
Em pequenas ondulações
Espelhadas de prata
A tua mão tocou na minha
Apenas por um momento
E as batidas do meu coração
Juntaram-se à melodia do Tejo
Do outro lado da ponte
Milhares de luzes de casas
De candeeiros de rua
De faróis de automóveis
Mas ali nada...
Só nós dois...
Sob um tecto de astros brilhantes
Com um manto verde aos nossos pés
Salpicado de pequenas gotas cristalinas
'Vamos rebolar juntos na relva?'
As palavras calaram o silêncio...
Sempre tive ideias loucas, bem sei...
Mas sempre bastou um 'sim' para ganharem vida
Lembro-me da tua expressão
De espanto, de vontade, de entrega
E sem hesitar
E sem eu esperar
Levaste-me nos teus braços
Até ao ponto mais alto da encosta
Deitados, enrolámo-nos num só
Abraçados...
Pela primeira vez pousei a cabeça no teu colo...
Ouvi a tua respiração no meu ouvido...
Senti o calor da tua pele...
Juntos, rebolámos no meio de gargalhadas
Que ecoaram na noite
Juntos rebolámos...
Na relva ao luar...